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Mekaron nhyrunkwa, a cidade dos espíritos do voo 1907

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No dia 29 de setembro de 2006, um Boeing da Gol 737-800, que fazia o voo 1907, chocou-se contra um jato Legacy 600, causando a morte de 154 pessoas e que caiu em uma área de mata no norte do Mato Grosso.

O Boeing da Gol saiu de Manaus com destino ao Rio de Janeiro, mas faria uma escala em Brasília. Já o jato Legacy, saiu de São José dos Campos, em São Paulo, às 14h51, e faria uma parada em Manaus, com destino final os Estados Unidos.

Ao se chocar com a asa do jato Legacy, o avião acabou se despedaçando no ar, matando todos os tripulantes.

Foto: Reprodução/Força Aérea Brasileira

Os destroços ficaram espalhados após a queda do Boeing e atingiram 1.000 m², uma circunferência com raio de 20 km, em uma área cujo município mais próximo é Peixoto de Azevedo, distante 740 km de Cuiabá. Este é considerado o segundo maior acidente aéreo da história brasileira.

Na área onde o acidente aconteceu, ficava a comunidade Kayapó que vive nas aldeias da terra indígena Capoto-Jarina, no norte do Mato Grosso.

Mekaron nhyrunkwa, a cidade dos espíritos

Com a queda do Boeing, os destroços acabaram prejudicando a área, além da contaminação por querosene, derramado pelo avião, deixando o uso da terra impróprio. Lembrando que a área afetada foi de 1.000 m², o que corresponde a 1/6 da região da terra indígena Capoto-Jarina.

Entretanto, os prejuízos não foram apenas físicos, mas também espirituais. Isso segundo as crenças dos Kayapó, uma vez que na área onde exista o Mekaron nhyrunkwa, não se pode ser mais habitada.

De acordo com as histórias dos Kayapó, Mekaron nhyrunkwa, significa casa ou cidade dos espíritos. É uma área considerada sagrada, quase nunca frequentada, onde estão os espíritos dos mortos. Após o acidente, os indígenas deixaram de consumir o mel de abelha da região, além de não poderem mais caçar por ali nem fazer roças. Para piorar, uma das 12 aldeias precisou mudar de lugar por causa do Mekaron nhyrunkwa.

Foto: Gilvan Barreto

Mas foi somente em 2010 que os indígenas procuraram a Gol, pedindo a retirada dos destroços, para que a terra ficasse menos impura, lembrando que os responsáveis pela retirada dos destroços são as companhias aéreas. A Gol ignorou o pedido.

Segundo o cacique Megaron Txucarramãe, a interdição do espaço era considerada duradoura, “kayoikot”, ou seja, para sempre.

Devido às solicitações, surgiu então, uma proposta de indenização por danos espirituais, a primeira a ser realizada pelo direito brasileiro. 

O inquérito civil público foi aberto em 2014, o Ministério Público Federal (MPF) montou uma comissão para debater os impactos ambientais e espirituais provocados pela queda do avião na terra indígena.

Foto: Gilvan Barreto

Diversas reuniões foram realizadas para decidir qual o veredito do inquérito. As tratativas do acordo extrajudicial duraram dois anos e contaram com encontros com lideranças espirituais que relataram sobre a privação da área, considerada agora uma casa dos espíritos. 

Em uma das reuniões, a liderança espiritual da etnia, Bedjai Txucarramae, afirmou que os indígenas não devem nem mesmo circular pela área, sobretudo à noite, horário em que os Kayapó acreditam que os espíritos saem pela mata (segundo a crença da etnia, os espíritos temem a luz do dia).

Em uma reunião realizada em junho de 2016, os advogados da Gol Linhas Aéreas informaram que a retirada dos destroços era inviável em razão dos custos e da logística necessária, assim como pelos danos ambientais que seriam causados com esse trabalho.

Foto: Agência Pública

Com isso, em 8 de novembro de 2018, os indígenas propuseram uma indenização de R$ 4 milhões a ser destinada ao Instituto Raoni, com o objetivo de que fossem empregados em favor da comunidade indígena e “pela luta dos povos indígenas”. Segundo o procurador responsável, Wilson Rocha Fernandes Assis, de Barra do Garças, não houve contraproposta por parte da Gol Linhas Aéreas.

Ao fim da reunião, o procurador de Barra do Garças solicitou uma perícia antropológica dos danos causados ao povo Kayapó em decorrência da queda da aeronave e a análise sobre a inviabilização do uso de cerca de 1200 km² da Terra Indígena Capoto-Jarina. A perícia foi finalizada em dezembro de 2016 e o dinheiro foi depositado.

Foto: Gilvan Barreto

Fonte: Portal Amazônia

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