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No Amazonas, mulheres com idade entre 34 a 64 anos são as maiores vítimas do crime.”Eu era violentada sempre quando ele chegava bêbado e drogado aos finais de semana. Também cheguei a ser agredida dentro de casa e algumas vezes em espaços públicos”. Essa era a rotina vivida pela amazonense Doracy Rocha, de 42 anos, durante um casamento de sete anos com o ex-marido. Ela, assim como as mais de 36 mil vítimas de violência contra a mulher no Amazonas, faz parte de um cenário violento que, em sua maioria, ocorre dentro de casa.
No estado, o número de casos confirmados de violência contra mulher aumentou 42,9% em três anos -no período de 2021 a 2023. No último ano, 64% destes crimes aconteceram dentro da própria casa das vítimas. Os dados são da Secretaria de Estado de Segurança Pública do Amazonas (SSP-AM).
O ciclo vivido por Doracy Rocha reduziu quando ela decidiu se separar e pedir uma medida protetiva para que o então marido se mantivesse longe. O recurso está previsto na Lei Marinha da Penha e ocorre para garantir a segurança das vítimas enquanto houver risco à integridade física, psicológica, sexual, patrimonial ou moral.
“Sofri muito. Agressões verbais, agressões corporais, traição, desprezos, mentiras, preconceito, tortura psicológica enfim, uma separação muito conturbado”, destacou Doracy, acrescentando que as agressões vividas deixaram sequelas em sua saúde mental. Ela se separou há quatro anos do agressor.
Dados da SSP mostram que mulheres com idade entre 34 a 64 anos são as maiores vítimas do crime. Diariamente, a Delegacia Especializada em Crimes Contra a Mulher (DECCM) atende, em média, 60 mulheres vítimas de violência doméstica.
“Nós temos, em média, 60 mulheres atendidas diariamente. Dentre os principais atendimentos, temos o registro de boletim de ocorrência (BO), mulheres que também são rechamadas. Além daquelas que aparecem para pedir orientação”, explicou ao g1 a delegada titular da DECCM, Débora Mafra.
Dentre os crimes denunciados, 20% são referentes à agressões sexuais no âmbito da violência doméstica cometidos por parceiros e familiares próximos à vítima, segundo a delega.
Desde 2021, o aumento da violência doméstica no Amazonas representa 42,9% do total de casos. Somente em 2023, esse crime vitimou 36.526 mulheres, o que equivale a 11% a mais de mulheres violentadas em comparação ao ano de 2022, quando se registrou 32.340 casos no estado.
Perda no futebol e na vida da mulher
Ao se tratar de picos de atendimento às vítimas, a delegada responsável pela DECCM explica que os dias de sexta-feira e sábado à noite, domingo de manhã, e após o almoço, são sempre horários em que as agressões aumentam na capital.
“São momentos que realmente crescem o número de denúncias, ocorrências e também flagrantes”, disse.
Ainda segundo ela, durante e após os jogos de time do futebol brasileiro a demanda também cresce na delegacia, em virtude das agressões cometidas por parceiros dentro de casa.
“Sempre nos jogos acontecem. Sempre! Em qualquer jogo, ainda mais de times muito populares no país. O time perdeu, a mulher apanhou. Por incrível que pareça. Tem jogos que são emblemáticos para que esses casos aconteçam. O marido bebe e a mulher acaba apanhando. Quando ganha não acontece, mas quando perde sim, bastante”, reforçou.
Importância da Lei Maria da Penha
Sancionada em 7 de agosto de 2006, a Lei Maria da Penha é vista como um avanço nos direitos das mulheres brasileiras. Foi a partir dela que se foi possível conceder ao grupo as Medidas Protetivas de Urgência (MPU), a fim de proteger legalmente as vítimas dos agressores.
Doracy, assim como muitas brasileiras, foi atendida pela medida protetiva. À época, após muitos momentos violentos, ela pôde se sentir mais segura. E, embora o agressor tenha descumprido a medida algumas vezes, ela vê nesse recurso uma maneira de inibir as agressões.
“Muita vezes falamos que ela não salva vidas, mas salva sim, porque pelo menos inibe o agressor de se aproximar diretamente a você. Então, acho muito importante que façam, sim, a medida protetiva”, incentiva ela.
A delegada Débora Mafra frisa a importância da medida para que o ciclo de violência se rompa na vida da vítima.
“Quanto mais medida protetiva forem solicitadas, menos mulheres estarão morrendo em decorrência da violência doméstica, porque a MP afasta o agressor da vítima e também existem outras redes de apoio que entram nesse momento para socorrer essa mulher, e impedir que novos episódios voltem a acontecer”, frisou a delegada.
No ano passado, foram registrados 37 feminicídios em todo o Amazonas. Deste total, somente uma medida foi concedida. Em mais de 90% dos casos, a vítima não havia pedido o benefício à Justiça.
Em 2024, já há dois casos de violência contra a mulher que acabaram em morte. De acordo com a delegada, nenhuma solicitou a MPU.
Antes da criação da lei, as vítimas, mesmo indo à delegacia, voltavam a conviver com o agressor, até o julgamento do caso e decisão do juiz. Em muitos dos casos, o suspeito era sentenciado a pagar apenas uma cesta básica.
Comparado ao cenário nacional, o Amazonas possui o menor de número de mulheres que declaram conhecer a lei Maria da Penha. A 10° Pesquisa Nacional de Violência contra as Mulheres, divulgada em 2024, aponta que o patamar do estado, representado em 17%, é inferior comparado às brasileira como um todo (24%).
A defensora pública, Caroline Braz, que coordena o Núcleo de Promoção e Defesa dos Direitos à Mulher (NUDEM), da Defensoria Pública do Amazonas (DPE-AM), explica que o serviço busca fornecer, antes da solicitação de medidas protetivas de urgência, orientação jurídica, psicológica e social às assistidas.
“Considerando os tipos de violência expostos na Lei Maria da Penha, os casos de violência moral (injúria, calúnia, difamação) são os de maior incidência no NUDEM, seguido dos casos de violência psicológica (ameaças) e dos casos de violência física (lesão corporal, vias de fato)”, afirmou a defensora.
O NUDEM também trabalha em rede com outras instituições municipais, estaduais e organizações privadas atuantes na área da violência contra a mulher, que inclui o encaminhamento para serviços de saúde, assistência social, segurança pública e outros.
Denúncias
As vítimas de violência doméstica podem procurar qualquer um dos Distritos Integrados de Polícia (DIPs) na capital e interior. Em Manaus, existem três unidades especializadas no atendimento de violência doméstica.
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