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Diferença de tratamento em campanhas revela como as conquistas de mulheres em posições de poder são constantemente ofuscadas por um julgamento desproporcional, baseado no gênero.
Por Dora Tupinambá (*)
O machismo estrutural, presente em diversas esferas da sociedade, revela-se com ainda mais força durante as eleições, principalmente quando o eleitor precisa escolher entre candidatos de gêneros diferentes. Esse cenário se torna evidente ao analisar a maneira como as campanhas de mulheres líderes, como a prefeita Patrícia Lopes, de Presidente Figueiredo (AM), e a vice-presidente dos Estados Unidos, Kamala Harris, são tratadas. Apesar das realizações significativas de ambas, o foco das críticas geralmente recai sobre o que ainda não foi feito, enquanto o peso das conquistas alcançadas é, muitas vezes, minimizado ou até ignorado.
Quando uma mulher assume o poder, seja em um pequeno município no Brasil ou no cenário global dos EUA, a expectativa em torno de sua gestão é desproporcionalmente elevada. Patrícia Lopes, prefeita de Presidente Figueiredo, entrou para a política em um contexto histórico marcado por décadas de gestões predominantemente masculinas. Mesmo assim, ela conseguiu, em um único mandato, impulsionar o desenvolvimento da cidade, resolver pendências deixadas por governos anteriores e implementar políticas públicas inovadoras. Porém, em meio às suas inúmeras realizações, os holofotes frequentemente recaem sobre aquilo que, segundo críticos, “ainda falta fazer”.
A mesma lógica se aplica a Kamala Harris, a primeira mulher negra e asiática a ocupar o cargo de vice-presidente dos Estados Unidos. Desde que assumiu o posto, sua atuação em diversas frentes tem sido fundamental para o governo Biden, mas a narrativa crítica quase sempre se concentra nas áreas em que ela “deveria ter feito mais”, subestimando os obstáculos enfrentados por mulheres no exercício do poder.
Realizações ignoradas pelo gênero
O julgamento desproporcional enfrentado por mulheres na política é uma expressão direta do machismo estrutural. A sociedade ainda impõe às líderes femininas um padrão mais alto e implacável do que o exigido dos homens. No caso de Patrícia Lopes, por exemplo, é evidente como parte do eleitorado e até de adversários políticos insiste em destacar os desafios não solucionados durante sua gestão, ignorando o fato de que ela enfrentou crises globais, como a pandemia de Covid-19, enquanto os prefeitos que a antecederam tiveram mandatos mais longos e não realizaram um terço do que ela já conquistou.
Kamala Harris passa por uma avaliação semelhante. Mesmo sendo uma das vozes mais influentes e estratégicas do atual governo americano, muitas das críticas direcionadas a ela desconsideram o contexto complexo em que suas decisões são tomadas, concentrando-se mais no que “não foi feito” do que no impacto positivo de suas ações.
Dura realidade do machismo eleitoral
Esse viés se revela ainda mais durante períodos eleitorais. Estudos mostram que, enquanto candidatos homens são avaliados majoritariamente por suas propostas e competências, as candidatas mulheres são submetidas a uma dupla jornada de provas: precisam demonstrar não apenas habilidade política, mas também se defender constantemente de ataques relacionados à sua competência, que são exacerbados pelo machismo.
Mulheres em cargos públicos, como Patrícia Lopes e Kamala Harris, são frequentemente julgadas com mais rigor porque quebram o estereótipo de que a liderança é um papel masculino. Esse julgamento não se limita ao ambiente político; reflete uma mentalidade estrutural que ainda valoriza mais a liderança masculina e enxerga o sucesso feminino como exceção.
Desafio da reeleição e o machismo velado
No caso de Patrícia Lopes, o desafio de buscar a reeleição expõe ainda mais essa disparidade. Mesmo com o reconhecimento de seu trabalho por parte de muitos eleitores, o debate ainda é permeado por questionamentos sobre sua capacidade de fazer “mais”. Assim como Harris nos Estados Unidos, Patrícia é constantemente colocada à prova em um cenário onde o machismo se disfarça de cobrança por “resultados” que, quando alcançados, ainda assim são relativizados.
O machismo nas eleições evidencia como, para as mulheres, o desafio não é apenas cumprir suas promessas de campanha, mas também sobreviver a um julgamento enviesado e desigual. Para uma sociedade mais justa e representativa, é essencial que a avaliação de lideranças femininas seja feita com os mesmos critérios aplicados aos homens, valorizando o que foi conquistado, não apenas o que ainda está por vir.
(*) Dora Tupinambá é jornalista e editora-chefe do Portal Valor Amazônico. Foi a primeira mulher a presidir o Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Amazonas.
Fonte: Opinião Manauara
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