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Jogador diz que foi recusado por 50 clubes por ter fama de gay

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Embalado por um dos sucessos da cantora sertaneja Marília Mendonça, Elyeser canta de forma descontraída em sua casa em um dia de férias em 2017. Animado, ele se filma e compartilha o momento em um grupo de WhatsApp com os companheiros do Goiás, seu clube na época.

Eram apenas dois dos vários vídeos trocados ali, geralmente com brincadeiras entre os amigos. Quatro anos depois, em 2021, os trechos viralizaram. E a carreira do volante nunca mais foi a mesma.

— Fiquei oito meses sem jogar por causa disso. Cheguei a pensar em jogar de graça, que iria parar de jogar. Toda vez que meu nome aparece em uma negociação alguém lembra desse vídeo. E aí solta um: “Ah, não vamos trazer o Elyeser porque vai chegar a um determinado momento de clássico os torcedores rivais, se ganharem da gente, vão pegar esse vídeo…”. Eu cheguei a escutar isso de presidente, de diretor. Então não era pelo lado técnico, era esse o empecilho — afirmou Elyeser, de 32 anos, hoje jogador do Santa Cruz.

O “empecilho” tem nome: homofobia. O episódio 9 do podcast ge “Nos Armários dos Vestiários” fala sobre os boicotes que gays e simplesmente quem tem fama de gay sofrem dentro do futebol.

Elyeser, que se declara heterossexual, foi anunciado como reforço do Paysandu em fevereiro de 2021. Os vídeos se multiplicaram nas redes sociais menos de dois meses depois, em abril. Em maio, ele foi afastado e passou a treinar separado do elenco.

Depois de quatro semanas isolado, o clube decidiu rescindir o contrato e dispensá-lo. A passagem pela equipe paraense foi bastante apagada: apenas 11 partidas, começando a maioria delas no banco.

— Por causa de um vídeo. E não vem ao caso se é uma brincadeira, se não é uma brincadeira. O fato é que, pelo vídeo que ele fez, praticamente todas as portas se fecharam no futebol. Eles (os dirigentes) não queriam analisar o jogador Elyeser. Isso foi o que mais me chocou. Eles não analisavam, não viam os números dele. Diziam apenas que não contratariam homossexual — explicou Diogo Pinheiro, empresário do jogador.

Elyeser, volante do Santa Cruz — Foto: Rafael Melo/Santa Cruz

Elyeser, volante do Santa Cruz — Foto: Rafael Melo/Santa Cruz

Quando Diogo começou a representar Elyeser, em dezembro de 2021, o volante já estava sem clube há sete meses e não foi nada fácil recolocá-lo no mercado. Segundo o empresário e o próprio jogador, mais de 50 clubes foram procurados. A maior parte se negou a contratá-lo por causa dos vídeos.

— Eu perdi a conta de quantos times, mais de 50. Da Série B foram 17, mesma coisa na Série C, mais alguns clubes da Série D fecharam as portas para ele. Inclusive alguns clubes que só jogavam o Estadual. Em praticamente todos a resposta foi a mesma. Essa parte dele fora de campo não viabilizaria a contratação — disse o agente.

Em uma das tentativas, Elyeser conta que já estava tudo acertado com um dos clubes da Série B, mas tudo mudou quando, de novo, o vídeo surgiu.

— Aí o presidente do clube me falou: “Esquece”. Imagina, todos os clubes fechando a porta, e eu sabendo que tenho qualidade, sabendo que posso ajudar muitos times. Acho que tem muita gente que não está mostrando seu talento por causa de preconceito. Isso tem que parar. Tem espaço para todos — disse o jogador.

— A gente já tinha o acordo salarial. Tudo o que faz parte da negociação já tinha, inclusive, até uma apresentação programada. E aí, quando o presidente desse clube se inteirou do vídeo, ele desistiu da contratação e falou com essas palavras: “Infelizmente, vou ter que cancelar, porque não posso contratar veado para o meu time. Se eu perder um clássico, a torcida me mata” — contou Diogo.
Elyeser, volante do Santa Cruz, treinando no Arruda — Foto: Marlon Costa/Pernambuco Press

Elyeser, volante do Santa Cruz, treinando no Arruda — Foto: Marlon Costa/Pernambuco Press

Somente em janeiro deste ano o agente conseguiu emplacar o jogador no Santa Cruz, clube que disputa a Série D. Mesmo assim, eles tiveram medo de que o negócio fosse melar quando a torcida do Náutico, um dos principais rivais do Santa, passou a usar os vídeos para fazer provocações ao volante.

— O Leston Júnior (agora ex-treinador do Santa) bateu no peito e não deixou isso acontecer. Essa história do vídeo prejudicou muito. As pessoas julgam por um vídeo, não pelo o que eu apresento em campo? Eu acho que é aí que está o erro. Acho que é aí o grande problema. Tem gente que me liga e fala: “Elyeser, o que você está fazendo na Série D? O que aconteceu?”. Tem gente que não sabe.
 
Foto: Rafael Melo/Santa Cruz

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